São Paulo XX de XX de 19XX
Pai,
Como é que o senhor está?
Tanto tempo não nos vemos, casei e estou fazendo uns bicos. Saí daquele mercado de merda. O judeu queria transferir a gente pra outra firma dele. Filho da puta ganhou dinheiro em cima de nós. Mandei ele pra puta que pariu.
O lugar era longe de casa e ia ganhar a mesma merreca, nem registro em carteira ia mudar. Trabalhei anos no mercado de bosta dele pra ele me tratar assim? Pra esse cara nunca mais faço nada.
Arrumei um bico agora no final do ano, no shopping, vou ficar na manutenção e montagem da árvore de natal. Sei que vai ser bom. Vou comprar as coisas para a ceia de natal com essa grana. Minha mulher tá se formando em direito, faz estágio e tudo, tá ganhando mais que eu.
Caso o senhor queira aparecer em casa, pode vir, tô morando no Imirim.
Essa carta ele iria gostar. Talvez por isso não tenha mandado. Nesse momento acreditei que a vida seria boa. Casado, morando longe de todos os que torravam minha paciência, sem o emprego que fodia meus dias e com um bom dinheiro garantido no final do ano. Pensei até em tirar a carta pra categoria D. Comprar um caminhãozinho e viver de carretos. Esperei por muito tempo a melhora, achei que seria uma fase ruim, que todos dizem, “tem que se foder” ou “comer o pão que o diabo amassou”. Frases feitas pra iludir. Quem se fode se fode.
Acreditei em Deus até meus treze anos. Os mandamentos proferidos na igreja não eram cumpridos pelos seus fiéis, Jesus não me parecia herói, parecia um covarde. Depois de assistir os filmes bíblicos tive certeza, é uma grande besteira.
Conheci o Mauricio naquele natal, dizia ser grego, fazia bico de Papai Noel todo ano no shopping norte. “Sou Papai Noel por ser a única profissão para um velho solitário, tenho fobia de crianças e nesse período do ano, bebo vodka todos os dias”.
Sem família, alcoólatra e fumante, péssimo humor e contava piadas sobre papagaios. O único que sentava do meu lado no refeitório.
Odiava crianças e odiava muito os bancos. Acho que odiava mais crianças. Família é a continuação de Deus e depois vêm os bancos, são instituições nefastas, você fica preso, é pra sempre. Concordei e ainda concordo. Melhor é viver só e sem conta bancária. Papai Noel de shopping recebia em cheque nesses tempos.
Mandei currículos por alguns bons anos pra vagas de Papai Noel, nunca fui chamado. Devo ser muito magro ou ter uma cara muito triste.
Perdi todos os concursos possíveis, até para vagas de limpador de privada fui reprovado, cheguei a pensar que era pela aparência, mas como explicar as redações e as dinâmicas de grupo, sempre reprovado. Não me enquadro na categoria de herói, nem na de vilão, tão pouco na de coitado, nem tenho categoria, nem filho.
Seleção de RH é difícil de entender, sempre me surpreende, odeio os testes e dinâmicas de grupo, qual a necessidade de fazer tantas provas pra ser recepcionista ou balconista, desconfio que é a frustração das pessoas que trabalham na seleção, psicólogos medíocres que não arrumaram empregos em clínicas e ganham dinheiro julgando quem vai entrar pra empresa, uma diversão e um jeito de colocar as maluquices da faculdade em prática.
Esses RHs, fazem a seleção natural pro capitalismo, escolhem quem vai morrer de trabalhar e quem vai morrer de fome, sem trabalho.
Marcelo da Silva Antunes nasceu em São Paulo, no dia 13 de junho de 1992, dia de Santo Antônio e de Exu. É Autor de VIVAVACA -2017, SP: Sem Patuá (editora Patuá) - 2018, Outros Cortes (Selo Borboleta Azul) -2019, Manifesto da hora que o couro come (Selo Borboleta Azul) -2020, e do livreto Velho, Velho Testamento - 2019. Editor do selo literário Borboleta Azul e da Revista Agagê80 (Brasil/Portugal) agitador cultural e oficineiro de escrita criativa.
Esse folhetim é um oferecimento Borboleta Azul, reavivando um formato muito popular no Brasil e no mundo. Ele tem como objetivo semear a leitura e despertar leitores, grandes nomes da literatura já escreveram folhetins como; Machado de Assis, Lima Barreto, José de Alencar entre outros, o texto era publicado em jornais.
Quem gostou da novela, pedimos que divulguem, espalhem por aí e se tiverem interesse em apoiar o trabalho do artista, fazer uma transferência bancaria, (como uma forma de comprar o folhetim) com qualquer valor (todo valor será repassado integralmente ao artista). As pessoas que colaborarem terão seu nome nos agradecimentos de cada capítulo (opcional. Se quiser seu nome, mandar e-mail pro [email protected] com seu nome), até o final da novela como uma singela homenagem.
Nossas sugestões são de 10 reais se você leu alguns poucos capítulos, 20 se você leu uma boa parte e pretende ler tudo, e 40 se você gostou muito desse projeto e quer que ele tenha vida longa.
Dados do artista: Marcelo da Silva Antunes
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Marcelo da Silva Antunes
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