– Você não acha que é muito cedo pra gente se amar?
– 10 anos é muito tempo.
– A gente se ama a 10 dias.
– Poderiam ser 10 anos.
– Mas são apenas 10 dias, talvez um pouco mais.
– Quanto tempo você demora pra odiar alguém.
– Um estalar de dedos e uma olhada torta.
– Viu, você não precisa de 10 anos pra odiar alguém, é bem rápido.
– Mas pra amar é um tanto diferente, depende de conexão, de sexo, de estabilidade, de indicação, de gatos, cachorros, comida, filmes, séries, beijos, chupadas, lambidas, conta bancária, cama, colchão, remédios pra dormir e outra infinidade de coisas.
– Me parece complexo, pra que tudo isso?
– É bom ter uma segurança pra não dar errado.
– E se a gente ficar tanto tempo procurando essa segurança e esquecer de amar o outro?
– Você vai esquecer que me ama?
– Nunca, estará gravado por 10 anos, mesmo que a gente só se ame por 6 meses.
– Talvez por 6 anos.
– E mesmo assim sempre inseguros, e com medo, e ódio, e dor.
– Amar dói mais do que eu gostaria, realmente poderia ser mais fácil.
– Poderia, mas tem essa segurança na nossa equação, misturado a toda uma insegurança da nossa vivência e com um brinde de personalidades pessimistas.
– Malditos sejam os pessimistas!
– Malditos! Que acordam cheio de ódio, raiva, e vomitam suas reclamações aleatórias, e pisam em seus próprios calos, e reinventam suas dores, e sofrem por toda a ansiedade possível, malditos sejam!
– Acho que você tá descrevendo uma pessoa ansiosa, não um pessimista.
– E não é a mesma coisa? Ambos vivem em função do que pode dar errado.
– Na verdade você é um ansioso pessimista, não sei se é um bom exemplo.
– Acho que é um pleonasmo isso.
– Tudo bem, te amo mesmo assim.
– Eu também te amo, e por que você me ama?
– Eu te amo porque não amo, bastante ou demais a mim. Porque amor não se troca, não se conjuga nem se ama. Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo…
– Não me venhas com poesia! A pergunta foi lógica!
– Sinto muito meu amor, amar é filosofia, não é matemática.
– Achei que fosse biologia, aquela questão da reprodução.
– Se fosse assim, não existiriam casais gays…
– Justo, amor é psicologia então?
– Pode ser também, uma parte do meu cérebro me diz que você é a pessoa da minha vida, mesmo com todo esse mau humor e pessimismo e ansiedade e depressão e solidão e esse ar todo seu.
– Obrigado pela parte que me toca… A pessoa da sua vida… Que vida?
– A que a gente vive aqui e agora, que pode durar 10 dias, mais 10 noites, talvez 10 semanas, talvez 10 meses, talvez 10 anos, talvez 10 décadas…
– Vivemos em função do amor?
– Não, o amor vive em função da gente, porque duas pessoas sem perspectiva precisam se amar pra se sentirem um pouco mais vivas.
– Talvez isso nos dê segurança.
– Talvez sim, talvez não, como eu disse, é pura filosofia, é poesia, é diálogo, é texto, é sexo, é penetração, chupadas, lambidas, gemidos e tudo aquilo que você gosta.
– Gosto da parte sexual desse amor.
– Também gosto, aproveite enquanto dure, uma hora acaba.
– O sexo ou amor?
– As duas coisas, tudo acaba mesmo.
– Pelo visto ambos somos pessimistas…
– Olha pra mim, você espera otimismo de alguém que te ama?
– Espero bastante insanidade, depressão, ansiedade, comorbidades mentais e por aí vai…
– Você espera um espelho, mas vai por mim, eu não sou um espelho, nem seu reflexo e muito menos você.
– Fico feliz por isso, odiaria me amar.
– Nem é tão difícil assim, você poderia se amar mais, mas tudo bem, eu te perdoo por isso.
– Me amar é uma coisa muito difícil, te amar é muito mais fácil.
– Sua cabeça perdida é ótima pra amar, tão complexa, tão pessimista, tão deprimente, acho um amor.
– Você tem gostos estranhos…
– Que bom, se não tivesse, não estaríamos conversando agora.
– Então você me ama?
– Te amo, até que depressão nos separe.
– Até que a morte nos separe.
– Até que a vida nos separe.
– Até que o álcool nos separe.
– Até que os antidepressivos nos separem.
– Até que os textos construam memórias.
– E assim fique eternizado no passado, pra gente esquecer do futuro e lembrar que a gente se ama.
Pedro Guilherme, nascido em 1993, publicitário por formação, designer gráfico por profissão e escritor por paixão.
Apaixonado por cinema, literatura e gatos.
Fotógrafo, cozinheiro e pugilista nas horas vagas.
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