Poeminha
Este poema pretende não se alongar
No mais, pede desculpas pela
intromissão,
Pelo desperdício de tempo em texto
reflexivo
meramente performático filosófico
Pretende retratar-se das próximas
vezes
que cogitar colocar-se entre o fogo
cruzado
da tua preciosa informação
que não precisa de pausa coisa nenhuma
que isso é para os tolos
Portanto esse poema se cala
diante de todos os discursos
proferidos
Um abraço de letras desculposas desse
poeminha.
Mostro monstro
Depois de secar meu rosto
Sigo o ritual de pintura
Mas o sentimento teima em brotar
Molhado
Minha máscara é muito frágil
Não esconde meu monstro de ninguém
Sou um amontoado de papéis amassados
que contém boas intenções escritas
Qualquer vento me bagunça
e expõe
o que eu tento esconder até de mim:
sou ordinária, falha, monstro.
Millenials
Ela carregava nas costas
um saco de formato duvidoso
e peso incalculável.
Diante do balcão,
deu um jeito de chamar a atenção dele.
O dono da internet,
fluente em espetáculo,
euforia
e metralhadora
de pocket-pensamentos,
obteve a seguinte resposta
quando perguntou o que ela queria:
“Eu juntei aqui todos os likes,
que me prometeram felicidade picada,
em forma de endorfina rápida.
Em troca dessa imensa coleção,
de que cuidadosamente não usufruí,
quero uma felicidade mais plena e
sossegada”
Ele não pôde atendê-la,
pois não sabia do que se tratava
esse tipo de felicidade.
Oficina de contato
Poesia não!
Que poesia
É arbitrária
É homem branco canonizado
Intocável na santidade
E no passado.
Cercamento.
Prefiro contato
que o contato
Ao contrário
É o que liga, marginalizado
Para além da academicidade
Está dado:
Relacionamento
Link
Eu e você
O nosso contato contém a poesia.
Like é vida!
Like a boss
Clica clica clica
Compartilha, reparte
Em finas fatias
Clique clique clique
Like é vida?
Quanta vida no like?
Chuva de like
hashtag, meme, trend, hype
É tudo momento
Ritmo frenético
Só o feed é infinito
Qual é o peso
o cheiro
o gosto
do like
que alimenta
o algoritmo?
Engajamento? É like
Clica clica clica!
Like is money, baby
Like é vida!
Viraliza, vicia
Turn down for what?
All you need is likes!
Ansiolítico ou poema para parar o tempo
O exercício que proponho é simples:
Tenha um relógio parado na parede.
Parado porque fixo na ponta do prego
E imóvel porque o ponteiro aponta
Para o mesmo ponto
Continuamente.
Esse altar à pausa
Vai contra a corrente do feed
Protesta silencioso contra a
notificação
que belisca o pensamento
Contra a tela que insiste em capturar
o tempo.
O relógio parado pede aos olhos
Um oásis de agora.
O relógio parado na parede, indolente
Não marca mais as horas
Marca a presença no presente.
Aconselho, por isso,
Tenha um relógio parado na parede:
Um lembrete!
Veja bem, estar adiantado não adianta
Tampouco estar atrasado compensa
Ajuste para o tempo do teu toque no
peito
O vívido vivido
Suspenda todo o resto
E respira.
Alívio.
Série originalmente chamada de
Poeminhas, escrita e apresentada por
Mari Mendes no SESC Sorocaba em maio
de 2018, a convite do poeta Evandro
Aranha no evento A Poesia Morreu,.
Mari Mendes é redatora, mãe e escritora. Seu primeiro livro, de contos, Potências do Encontro (2019, Patuá), foi contemplado pelo Prêmio Sorocaba de Literatura em 2021. É colaboradora da Revista Digital Livro & Café. Publicou textos em zines, coletâneas e revistas literárias. Em 2022 lançará seu primeiro romance.
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